"Quero alguém que me ame como eu sou, e não como
gostaria que eu fosse..."
Enquanto terminava de se arrumar, postou a frase em seu
perfil na rede social. Entre uma passada de batom e uma mexida no cabelo, ela
espiava a tela do computador, à espera dos comentários e da aprovação dos
amigos virtuais.
Sem levantar da cadeira, inclinou o corpo para o lado e
ficou de frente para o espelho da penteadeira. A maquiagem, pesada e forte,
fingindo naturalidade, estava pronta, mas ainda faltavam as lentes de contato.
Mesmo depois de alguns meses de uso, seus olhos ainda não estavam acostumados a
elas, e ainda que sempre ardessem por vários minutos depois de colocá-las, ela
nunca saía sem as lentes. Olhos castanhos eram muito comuns e sem graça, e
morenas de olhos verdes eram irresistíveis, dizia o site de moda e beleza que
ela costumava acompanhar.
Por fim, levantou-se e foi até um espelho grande, preso
atrás da porta do quarto. Com os olhos ainda vermelhos e lacrimejantes, deu uma
última olhada em si mesmo. O vestido, tão apertado e desconfortável quanto seus
sapatos, definia exageradamente seu corpo e ajudava a esconder a barriga saliente
que ela acreditava ter. Não gostava muito daqueles modelos curtos e justos,
incômodos para vestir, sentar e caminhar e que sempre lhe davam a sensação de
estar mostrando mais do que deveria ou gostaria, mas de qualquer maneira, era
preciso. A beleza não deve ser escondida, segundo aquele mesmo site.
Na verdade, ela não estava a fim de sair. Pensou em ligar
para as amigas e dizer que não poderia, que precisava estudar, que estava com
cólicas, mas ainda que tudo fosse verdade, – e era - achou melhor não recusar,
afinal, é preciso socializar-se. Não valia a pena arriscar perder bons amigos e
companheiros de balada por tão pouco, quase nada.
O som de uma buzina a tirou de seus pensamentos. Os amigos
haviam chegado. Novamente, olhou-se no espelho, puxou o vestido um pouco mais para
baixo, tentando cobrir o que fosse possível de suas pernas, mesmo sabendo que
ele teimaria em subir novamente, e saiu do quarto. Ao fechar a porta, percebeu
que o computador ainda estava ligado. Rapidamente, voltou, aproveitou para dar
uma última olhada nas atualizações e depois o desligou.
A sua frase já não estava mais na tela. Fotos, citações e
pensamentos de outras pessoas já haviam ocupado seu lugar, mas isso não
importava, pois ela sequer lembrava que havia escrito e nem o que havia escrito
há alguns minutos.
- Quero alguém que me ame... – Disse ela, baixinho, para si
mesma, guardando apenas a parte que conseguiu lembrar e que parecia realmente
importante naquela frase.