segunda-feira, 30 de março de 2015

Cinco Folhas

   Treze e quinze anos, respectivamente.

   Três e pouco da madrugada.

   Estavam os dois parados em uma esquina, ouvindo e sentindo o vento através da roupa escassa.

   - O que você quer ser quando morrer?

   - Não sei... Acho que uma lufada de vento... Ou aquela terrinha que o vento sopra, sabe?

   - Sei... - Fez uma pausa. Após um assovio agudo do vento, retomou. - Mas por quê?

   - Não sei... Eu acho legal isso de estar em outros lugares... A terra que tava aqui, não tá mais... E sabe lá onde ela vai estar daqui a pouco, quando o vento soprar de novo...

   - Hum... É... É legal mesmo...

   - E ainda tem o jornal, né?

   - Como assim?

   - Bom... Além da terra, o vento também costuma soprar essas folhas soltas... E às vezes elas se misturam... A terra e o jornal, eu quero dizer...

   - Hum... Tá, mas... O que que tem a ver a terra, o jornal e a tua vontade de ser o vento?

   - Ah, que é que a terra é pequena e cabe inteira dentro de uma folha... Não deve passar frio... - Ele riu e esfregou as mãos.

   Ele também era pequeno, mas precisava de umas cinco folhas de jornal para fazer um cobertor decente. Não era muito, na verdade, mas nem sempre conseguia encontrar todas.

   Ainda mais quando ventava tanto, como agora.

Terra Queimada

Há guerreiros e guerreiros.

Há batalhas e batalhas.

Para cada batalha, um guerreiro.

Para cada guerreiro, uma batalha.

Para alguns, pesa o escudo.

Para outros, a espada.

E acima de qualquer peso,
Há o que é comum a todos.

Há a honra do combate.

Há a dor a ser superada.

Há os medos a serem depostos,
Como recursos que são destruídos
Na tática de terra queimada.

Não se deixa nada ao inimigo,
Muito menos o que for passível
De ser usado como arma.

Fogo, madeira, fumaça.

A armadura sem brilho.

O sangue seco no rosto.

As mãos machucadas.

A noite se aproxima
E as estrelas observam.

É hora de voltar para casa.

Quando se chega vivo ao fim do dia,
Até mesmo a derrota é uma vitória.

sábado, 21 de março de 2015

Seis e Pouco

Não te encontraria por aí,
Em lugares comuns,
Onde todos estão.

Percebi que, na verdade,
Sequer te encontraria
Se tentasse procurar.

Nosso encontro não seria feito,
Mas aconteceria pelo melhor
E mais improvável dos acasos.
Aquele que une quem tanto espera,
Mas que não sabe o que esperar.

Nosso abraço me fez sentir
Aquela sensação gostosa
De se olhar pela janela
E imaginar o vento frio soprando
Sem precisar senti-lo.

Gosto de suas linhas retas,
Quase duras, bastante sérias,
Que só se abrem para a chave certa.

Gosto do sorriso difícil,
Dado apenas aos merecedores.

E gosto, principalmente,
Quando ele se abre,
Pois me dá a certeza
De ser quem o merece.

Vou levar muito tempo
Para conseguir compreender
Como você conseguiu, em dez minutos,
Mostrar a mim mais do que tantos
Precisaram de anos para mostrar.

Quem diria...
Não são apenas folhas secas
E finais de tarde de sol ameno.

Quem diria...
Logo no primeiro dia,
O outono me trouxe você.

quarta-feira, 18 de março de 2015

...

   - Eu não entendo! - Disse ele. - Eu nunca, nunca menti para você!

   - Eu sei disso... - Ela respondeu. - O seu erro foi ter mentido para você mesmo...

segunda-feira, 16 de março de 2015

domingo, 15 de março de 2015

Areia

Aquele gosto estranho
Do que termina sem começar.

Aquele cheiro confuso
Do que não devia ter sido feito.

O dia seguinte é sufocante,
Com seu aspecto calado e confuso
E uma densa névoa de sentimentos tortos.

Nossos olhares esquivos,
Carregados com nossos erros,
São daqueles que não se cruzam,
Mesmo quando os ombros se tocam.

Em meio à brisa leve,
Agradável de ser sentida,
Uma rajada de areia fina
Nos faz fechar os olhos,
E quando os abrimos de novo,
Dói-nos ver o que perdemos
Por termos olhado sem atenção.

Andamos trôpegos por aí,
Tentando evitar encontros.

Optamos pelo silêncio
Para não pagarmos pelas palavras.

E vamos embora sem saber
Até onde, afinal,
Nós havíamos chegado.

Morremos um para o outro
Quando brincamos com coisas sérias
E levamos a sério as brincadeiras.

Já não sabemos o que há
E nem o que somos,
Mas sei que ambos sangramos
Nosso sangue mais valioso
Quando nos arriscamos a querer
Ser o que nunca fomos.

Não somos amigos.
Não somos amantes.
Somos apenas restos
De vontades e pensamentos.

domingo, 8 de março de 2015

Meteoro

Ao chegar, parecia ser estrela,
Daquelas cujo brilho norteia
Por anos a fio quem as observa.

Logo, porém, mostrou-se fugaz...

Sua luz, outrora tão firme,
Simplesmente desapareceu
Sob a opacidade translúcida
De uma simples nuvem passageira.

O viajante se perdeu...

Foi traído pela covardia
Do astro que tomou para si
Como guia de um caminho eterno.

Riscou o céu negro da noite
Com seu traço verde brilhante,
Iluminando um falso horizonte
Que teve fim ao amanhecer.

Com o tempo, seu rastro sumiu,
Tal como somem todas as coisas
Que têm por natureza não serem sinceras.

E de tudo o que poderia ter sido,
Tornou-se apenas cadente...